sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

A visibilidade homossexual

por Maria Lúcia P. de Oliveira

"Um dia numa sala de aula uma aluna falou: por que eles não ficam no lugar deles, sem agredir os costumes e a moral? A gente não é obrigado a conviver com esse tipo de comportamento, como explicar isso para as crianças?"

Falar sobre relações homoafetivas é entender que o que acontece nas relações entre pessoas do mesmo sexo não se refere apenas a sexualidade, a relações erotizadas. Alguns setores da sociedade ainda consideram o homossexualismo como doença. Temos as dificuldades das famílias em elaborar e aceitar seus filhos como eles são. Temos cidadãos que constroem suas vidas exercendo todos os seus direitos e deveres. Mas temos também os homofóbicos.
As principais organizações mundiais de saúde, incluindo o Conselho Federal de Psicologia, não consideram a homossexualidade uma doença. Em 1973, a Associação Americana de Psiquiatria deixou de classificá-la como doença; nesse mesmo período, também foi retirada do Código Internacional de Doenças. Já em17 de maio de 1990, a assembleia-geral da Organização Mundial de Saúde declarou que "a homossexualidade não constitui doença, nem distúrbio e nem perversão".

Contudo, a família, quando o filho ou filha assume sua identidade sexual, sente-se envergonhada e temerosa quanto ao futuro, de seus filhos e dela mesma. A grande maioria de pais sente-se culpada pela orientação sexual de seus filhos. Pergunta que parece inevitável: "Onde foi que eu errei?" As fantasias de ter netos, de ver o filho casado, e a necessidade de enfrentar as cobranças da sociedade são uma tarefa que merece um tempo para ser elaborada. Esses pais precisam também de um tempo para digerir seus medos, suas inseguranças e suas fantasias sobre como enfrentar vizinhos, parentes e preconceitos sociais construídos.

Até há bem pouco tempo, não se discutia a situação dos casais homossexuais, e o que existia eram guetos de homossexuais, a invisibilidade gay, verdadeira segregação social do HOMOSSEXUAL. Hoje estamos vivendo um processo inverso, o da visibilidade. E essa visibilidade parece ofender, provocar a ira daqueles que não toleram dividir o espaço com a diversidade de possibilidades de expressão do sujeito.

Os problemas enfrentados por casais homossexuais passam por todos aqueles de qualquer casal heterossexual e mais aqueles relacionados ao preconceito, à discriminação social. Viver uma relação como casal gay exige um custo emocional muito grande para os parceiros, pois, independentemente da orientação sexual, o que as pessoas buscam é amar, é ter gratificação, realização, é simplesmente "ser humano", ser respeitado.

Mas estamos avançando. Temos hoje uma situação socialmente provocadora, a visibilidade dos casais homossexuais. É um novo modelo conjugal que está sendo construído e que é difícil para os próprios casais, pela ausência de modelos de outros casais homossexuais. Assumir a vida como um casal gay, dividir, pagar contas, relações familiares, amigos, viver de forma visível nessa sociedade é uma tarefa inovadora e pós-moderna, que exige de todos nós novas atitudes diante dessa nova construção.

Estamos saindo de um modelo HOMOSSEXUAL estereotipado, caricato, para um modelo gay cidadão. Homens e mulheres que trabalham e constroem um mundo melhor, com parcerias, e com dignidade. A história é longa, cheia de turbulências. Abrir novos espaços, novos caminhos, mudar a cultura, tudo isso é uma tarefa árdua, difícil, pois mobiliza valores tradicionais daqueles que lutam para manter o status quo. E nesse momento, se não houver um esforço para a aceitação das diferenças, da diversidade de possibilidades de expressão do sujeito, as interações sociais podem tornar-se uma prática selvagem.

Maria Lúcia Pereira de Oliveira é mestre, psicóloga clínica e professora de psicologia

FONTE: JORNAL O POPULAR, dia 07/01/2011, p.13

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