terça-feira, 27 de abril de 2010

NEM MASCULINO, NEM FEMININO! E SE DEUS FOR GAY?


Um novo olhar sobre a questão do gênero humano e da imagem de Deus.


Reverendo Elias Mayer Vergara, ost

Para pensar na imagem de deus, precisamos pensar na imagem do ser humano. As categorias que atribuímos a Deus, são as categorias humanas: Pai, filho, mãe, espírito.... Se nossa representação de Deus é sempre uma representação do humano divinizado, quero então postular por um Deus gay!

É necessário de início fazer uma distinção clara entre sexo e gênero, para que possamos nos aventurar a este novo olhar. O sexo é um fator orgânico, biológico e é definido pelo espermatozóide que possui somente duas categorias: o masculino e o feminino. O sexo então estará claramente definido pelos órgãos genitais masculinos e femininos, pênis e vagina. Na natureza, do ponto de vista do sexo, há ainda a possibilidade da existência do hermafrodita. Este último sempre considerado como uma anomalia, pois desconstrói nossa bipolaridade quanto ao que a natureza humana pode produzir em relação a perpetuação da espécie. Outra coisa bem diferente é o gênero humano. O gênero é definido socialmente. É aquilo que uma determinada cultura atribui ao sexo feminino ou masculino. Para os escoceses usar saia é um hábito extremamente masculino, já para a nossa cultura ocidental, este é um costume ligado ao feminino. Assim, culturalmente definimos uma série de comportamentos, costumes, símbolos que atribuímos à homens e à mulheres de forma bem distinta. Assim sendo o sexo é aquilo que a natureza biológica produz, e o gênero é aquilo que a cultura produz .

Havendo gravidez, começam as especulações: será um menino? Será uma menina? Ninguém pergunta: será um homossexual?

Ninguém deseja ter um filho ou uma filha homossexual. Pois a homossexualidade é uma ameaça aos padrões sexuais definidos socialmente. É uma ameaça ao gênero. E confrontar estes padrões passa a ser um esforço que demanda muita energia.

Quando o obstetra dá a notícia do sexo para a mãe e o pai do bebê, ainda no ventre materno, já começa uma batalha social para garantir que o sexo anunciado vai de fato corresponder ao gênero desejado. Se for menino, a mobília do quarto, o enxoval do bebê, tudo estará relacionado com os padrões masculinos: a roupa do bebê poderá ser de qualquer cor, menos rosa, pois rosa é uma cor que identifica as meninas. No quarto do menino haverá uma mobília de cores fortes, e os motivos que ornamentarão o ambiente serão ligados a força, a guerra, a bravura. Entre os brinquedos dos meninos jamais estarão as bonecas, as miniaturas dos utensílios domésticos, pois estas coisas são de meninas. Já se o sexo for de menina, o cor será o rosa, os motivos de ornamentação serão suaves e lembrarão a ternura e os brinquedos serão bonecas e outros ligados as tarefas e afazeres do lar.

Muitas pesquisas demonstram que este cuidado em definir padrões simbólicos masculinos e femininos, são os responsáveis pela construção do mundo patriarcal e machista que conhecemos muito bem. Aquilo que é atribuído às mulheres como gênero feminino, cria nelas uma atitude de dependência, de fragilidade e subserviência. Já aquilo que é atribuído aos homens cria neles uma atitude dominadora, de força e de sub-jugamento. Ou seja, a sociedade para manter-se patriarcal e machista constrói para cada categoria sexual, um sistema simbólico próprio, que irá reproduzir e perpetuar os mesmos padrões sociais.

Levanto uma outra hipótese para ampliar esta discussão sobre o Deus gay: a necessidade cultural de definir padrões masculinos e femininos deve-se ao grande medo existente em nossa cultura ao gênero do homossexual. Assim como o hermafrodita é considerado uma anomalia sexual da natureza, o homossexual é considerado uma anomalia do gênero humano. E se deus for gay?

Quanto mais a cultura de nossa sociedade tentar forjar esteriotipadamente homens e mulheres com categorias absolutas, estará admitindo em seu inconsciente coletivo, a possibilidade do homossexual. Ninguém tem medo daquilo que não existe, a não ser que acreditemos em fantasmas. E a homossexualidade é uma realidade, ela existe de fato. Parece que acreditamos muito no ditado: “o hábito faz o monge”. Nem sempre isso é verdade. Mas com certeza nenhum monge se faz sem o hábito. Se há a necessidade de vestirmos os meninos diferentemente das meninas, isso prova que não basta ter um pênis ou uma vagina para que seja definido o gênero masculino e o gênero feminino.

Postular por uma categoria divina homossexual, é postular pela inserção da homossexualidade como categoria hermenêutica viável para se ler a vida humana na sociedade. Uma hermenêutica homossexual da Bíblia poderá também nos ajudar a relativizar a polaridade existente hoje entre uma hermenêutica machista e outra feminista da Bíblia. Isso fica muito evidente quando aprofundamos as discussões sobre qual gênero que podemos atribuir a Deus. Deus é masculino ou feminino? A possibilidade de um Deus homossexual pode ser muito mais desafiadora. Aliás não há registros na Bíblia de que alguém tenha visto o sexo de Deus. Se Deus não tem um sexo definido, assim como os hermafroditas, qualquer gênero lhe poderá ser atribuído. Deus pode também ser um deus gay.

Portanto a melhor composição trinitária poderia ser: Masculino, feminino e homossexual. Assim teríamos um deus muito mais humano e encarnado.

Nenhum comentário:

Postar um comentário